menina de ouro

(eu)genia
2 min readSep 7, 2020

Há quinze anos eu me apaixonei por uma menina. Por quase cinco anos de idas e vindas ela foi meu carma, eu era completamente apaixonada por ela. Talvez esse sentimento permaneça pra sempre como as primeiras coisas na nossa vida, mas só depois de todos esses anos eu consegui entender que por mais que eu a escolhesse, ela nunca escolheu a mim. Ela até se permitia por um tempo ser vulnerável, mas seguia por um caminho diferente em outra relação ou sozinha, e eu fazia o mesmo. Só que durante cinco anos quando eu estava quase longe o bastante eu escolhia ela de novo. É muito esquisito pensar nisso agora enquanto escrevo, porque sempre fui tão racional e por ela insistia em tomar as decisões mais irracionais que consigo lembrar. A trilha sonora do meu carma ironicamente é um pagode dos anos 90.

Eu avisei várias vezes que um dia eu iria embora, e um dia eu fui.

Temos duas versões desse fato, a minha e a dela. A minha versão inclui ela se engraçando com uma outra menina no telefone durante uma troca de mensagens de textos e risadinhas, então naquela tarde decidi que eu passaria o último dia com ela. Na manhã seguinte acordei, deixei meu anel de arco íris em cima da mesa e nunca mais voltei. A versão dela que descobri depois de dez anos é que ela não entendeu quando fui embora, na sua cabeça foi repentino e aleatório, porque segundo ela estava disposta a fazer dar certo. As mensagens eram inofensivas e disse que não estava me traindo. Obviamente eu ri dessa versão porque nós duas sabíamos que daria errado, cedo ou tarde.

Mas não dá pra mudar o passado e cá estamos nós. Eu fui embora, seguimos por rumos diferentes, consegui me desconectar daquele sentimento, mas nunca deixou de existir algo entre nós. Ela insistiu em me ligar todos os anos no meu aniversário mesmo sabendo que eu odeio aniversários. Nos reaproximamos recentemente e foi estranhamente bom perceber que ela continua com o mesmo cheiro e com as mesmas manias. Gosto da nova versão que cozinha e baixa minhas séries sem reclamar porque já aceitou o fato que eu só sei baixar vírus. Amadurecemos e isso ficou bastante evidente. Mesmo com soma dos anos e das decepções amorosas, estar ali era como se fosse a coisa certa e eu nunca tivesse ido embora. É como voltar no passado, mas com seis gatos a mais e um hermano que traz café sempre sorrindo. Entendemos que a gente pode se admirar e se gostar independente de qualquer relacionamento, por mais confuso que possa parecer, no fundo a gente só quer o bem uma da outra.

Talvez dessa vez ela fuja por mais dez anos. Mas está tudo bem, a gente se reencontra.

--

--

(eu)genia

carioca, casada com um gaúcho e mora na cracóvia. mãe de viralata com guarda compartilhada com ex. irmã mais velha, vegetariana, apaixonada por nerdice.