bodas de pluma

(eu)genia
4 min readAug 20, 2020

Eu não disse “Sim”, eu disse “Tá de sacanagem?”. E foi assim que respondi ao pedido de casamento. Depois de mais de cinco minutos durante o jantar tentando me surpreender e levando bronca por estar mastigando rápido demais ele desistiu do plano inicial que era fazer com que eu abrisse a caixa do quebra cabeça que estávamos montando e simplesmente catou a caixa do anel e se ajoelhou na sala. Estaria mentindo se dissesse que eu não esperava por isso, porque ele havia me enviado uma mensagem seis semanas antes avisando que me pediria em casamento. Mas eu custei a acreditar que de fato ele faria isso, porque na minha cabeça não tinha muita lógica querer passar o resto da vida comigo tão pouco tempo depois de me conhecer.

Ele segurou na minha mão por debaixo da mesa do quiosque, e ficou segurando a noite toda. E foi assim que ficamos a primeira vez, como se ele soubesse que eu não precisava de mais uma cantada, apenas de alguém para segurar minha mão. Depois disso eu tentei afastá-lo de todas as maneiras possíveis, além de ter repetido diversas vezes que eu só tinha ficado com ele inicialmente porque sabia que ele iria embora. E de fato ele foi, mas não me deixou partir.

Quando nos conhecemos eu havia saído de um relacionamento há pouco, e não por opção. Então por opção resolvi focar minha vida em mim e na viralata, sem dar muito espaço pra criar muitas expectativas de entrar em uma nova relação. Por insegurança e por preguiça mesmo, recomeçar dá muito trabalho, e eu tava machucada demais pra me permitir de novo. Ele me contou que havia recebido uma boa oportunidade fora do país e que era um sonho, então aproveitamos o período antes da mudança para ficarmos juntos praticamente todos os dias. Ele partiu no último dia do ano e fez planos por nós dois, enquanto eu apenas sorria e me deixava levar, sabendo que no dia seguinte seria um ano novo, e não sabia ao certo o que esperava por mim. Confesso que no início eu não dava muito crédito aos planos dele, continuava tentando viver um dia de cada vez e deixando que ele se adaptasse ao novo lar e ao novo desafio. Tanta coisa já tinha mudado na minha vida, então eu já estava esperando tudo dar errado e tinha blindado meu coração pra (tentar) não sentir demais. Só que eu não previa que ele seria tão teimoso e não me deixaria desistir.

Ele almoçou no mesmo restaurante por três anos antes de me conhecer e justificou que havia encontrado a equação perfeita de custo e benefício, então não havia porque se arriscar em almoçar em um lugar diferente. Aí ele decidiu usar a mesma lógica do porque insistia em ficar comigo, a equação era simples ele disse: não faria sentido continuar procurando por algo (ou alguém) que já havia encontrado independente de onde ele estivesse. Nesse meio tempo ensinei ele a experimentar coisas novas e ele vem se permitindo encontrar novas equações para levar a vida de uma forma mais equilibrada entre o que é certo e o que pode ser melhor ainda. Almoçamos em vários lugares diferentes e assim continuamos juntos, mesmo separados, aprendendo um com o outro e adicionando novas perspectivas e temperos. Para quem se alimentava praticamente de sanduíche e macarrão todos os dias eu ensinei a adicionar muitos sabores diferentes no cardápio, e ele me ensinou que independente da distância a gente poderia continuar fazendo planos juntos.

Ele me irrita praticamente todos os dias pelos motivos mais idiotas, nossa relação está longe de ser um mar de rosas, mas no fim das contas a gente se entende e se ama. Ele pode não entender sobre muitas coisas e tem muitas manias que me tiram do sério como não fechar nenhuma gaveta ou armário direito, mas ele entende bem sobre como me amar genuinamente. Ele se apaixonou pela pior versão de mim mesma, então tento ser um pouco melhor todo dia, para voltar a ser quem eu era antes de me machucar tantas vezes.

Há seis meses casamos e a cinco estamos longe novamente. Digamos que a pandemia não estava nos planos, mas tem sido um período de muito amadurecimento da relação. Minha mãe sempre me disse que a gente reconhece as melhores pessoas nas piores horas. Obrigada por não me deixar desistir e por ter segurado minha mão naquela primeira noite.

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(eu)genia

carioca, casada com um gaúcho e mora na cracóvia. mãe de viralata com guarda compartilhada com ex. irmã mais velha, vegetariana, apaixonada por nerdice.